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Canabinóides e o sistema cardiovascular

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Estudos nas últimas décadas têm demonstrado que os receptores CB1 e CB2, endocanabinóides (eCBs) e as suas enzimas anabólicas/catabólicas estão presentes nos tecidos cardiovasculares e podem desempenhar um papel importante no desenvolvimento e/ou progressão de distúrbios cardiovasculares comuns.

Estudos anteriores, com foco nos efeitos hemodinâmicos agudos em várias formas de choque e insuficiência cardíaca, demonstraram que sob essas condições patológicas, eCBs produzidos por monócitos/macrófagos contribuíram para hipotensão e inotropia negativa, via ativação do receptor CB1 cardiovascular.

Estudos posteriores investigaram os mecanismos de sinalização em cardiomiócitos de modelos animais e humanos, endoteliais e células musculares lisas vasculares e fibroblastos/miofibroblastos, usando vários modelos de cardiomiopatias clinicamente relevantes como insuficiência cardíaca, síndrome metabólica/diabetes e hipertensão. Estes demonstraram que células cardiovasculares também podem gerar eCBs sob condições patológicas, que por sua vez, através de vias CB₁-dependentes e/ou independentes, podem promover a geração de espécies reativas de oxigênio (ROS), sinalização do receptor de angiotensina II tipo 1, acumulação de produtos finais de glicação, switch da isoenzima de cadeia pesada de ẞ-miosina, remodeling/fibrose e ativação de proteínas quinases pró-apoptóticas ativadas por mitógenos, eventualmente resultando na diminuição da função da Ca2+-ATPase do retículo sarcoplasmático/retículo endoplasmático (ER) e morte celular, levando a disfunção/insuficiência cardíaca. Nesses ensaios experimentais, eCBs e/ou receptores CB1 foram aumentados/upregulated no miocárdio e antagonistas CB₁ melhoram a disfunção contrátil e todos os processos patológicos característicos acima mencionados.

Estudos experimentais com recurso a antagonistas CB1 e/ou animais knockout CB1, também sugeriram que eCBs, via CB₁ em macrofagos, podem promover processos pró-inflamatórios e o recrutamento de células inflamatórias, contribuindo assim para o desenvolvimento/progressão da aterosclerose, bem como a proliferação patológica do músculo liso associada com reestenose. O efeito pró-inflamatório do receptor CB1 no sistema cardiovascular também foi confirmado, usando inibidores e/ou animais knockout da enzima FAAH metabolizadora de eCB em modelos de aterosclerose e cardiomiopatia.

Em ensaios clínicos em obesidade/diabetes, o antagonista/agonista inverso CB1 rimonabant diminuiu múltiplos fatores de risco cardiovascular, incluindo marcadores inflamatórios. Níveis plasmáticos aumentados de eCBs foram fortemente associados a eventos coronários adversos ou alterações da função endotelial coronária em indivíduos obesos humanos. Vários relatos humanos sob antagonistas CB1, claramente estabeleceram que tanto a flor de canábis como o THC exerceram efeitos cardiovasculares CB1-dependentes e ensaios clínicos com agonistas CB₁ restritos apenas à periferia, para tratamento da dor, foram descontinuados por causa do desenvolvimento de cardiopatias adversas graves e consequências vasculares e metabólicas da estimulação CB₁.

Um estudo recente também levantou sérias preocupações sobre a segurança cardiovascular do uso de canábis em humanos, que são apoiados por numerosos relatos de casos em jovens adultos consumidores de canábis ou de misturas de agonistas CB1 sintético para uso recreativo.

Endocanabinóides e sistema cardiovascular

Em contraste com CB1, a sinalização CB2 parece ser protetora em doenças cardiovasculares. No endotélio, a ativação de células do músculo liso vascular e fibroblasto, a ativação CB2 diminui a ativação patológica, a proliferação ou a resposta pró-inflamatória/fibrótica e também pode exercer efeitos protetores em cardiomiócitos. Nas células imunes, a ativação do receptor CB2 atenua a quimiotaxia, a adesão de células inflamatórias, e sua ativação. Esses efeitos são responsáveis ​​pelas propriedades protetoras de agonistas CB2 em modelos pré-clínicos de aterosclerose, reestenose, infarte do miocárdio e acidente vascular cerebral.

No sistema cardiovascular os eCBs, via degradação em metabólitos do ácido araquidónico ou através de um novo canabinóide ou outro(s) (por exemplo, TRPV1) receptor(es), independentemente dos receptores CB1 e CB2, também podem exercer numerosos efeitos, dependentes do contexto, variando de vasodilatação/vasoconstrição até anti-inflamatório/pró-inflamação.

Coletivamente, há fortes evidências que apoiam a função patológica de um ECS hiperativo (particularmente CB1) em doenças cardiometabólicas. Pode-se concluir que:

  1. o ECS está desregulado na doença cardiovascular;
  2. eCBs e ligantes sintéticos exercem efeitos opostos sobre a lesão cardiovascular e inflamação através dos receptores CB1 e CB2, com os CB1 promovendo-os e os CB2 atenuando-os; e
  3. agonistas CB2 e antagonistas CB1 restritos perifericamente, parecem ser alvos promissores em doenças cardiovasculares.

O primeiro passo é procurar aconselhamento médico.