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Resultados do uso de fitocanabinóides no tratamento de epilepsias refratárias em humanos (2016-2018)

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Um estudo retrospetivo, publicado em 2017, documentou os resultados de 272 pacientes do estado da Califórnia e Washington, com diagnóstico de epilepsia refratária.  Estes pacientes usavam óleos artesanais à base da planta da canábis, com um quimiotipo CBD dominante, enquanto outros adicionavam THC ou THCa às preparações.  No total 86% dos pais reportaram redução da frequência das crises, com 10% conseguindo atingir a ausência completa de crises. Os benefícios incluíram melhorias no humor, do estado de alerta, apetite, comunicação e sono. Adicionalmente, os pais referiram melhorias com a terapêutica com menor frequência no uso de medicação de resgate, menos internamentos ou idas ao Serviço de Urgência (SU), com alguns pacientes sendo capazes de reduzir a quantidade e dose dos antiepiléticos que tomavam.

Os efeitos adversos incluíram sedação, diminuição do apetite e distúrbios do sono. Não houve alterações das enzimas hepáticas, apesar de altas doses de CBD.1

Resultados do uso de fitocanabinóides no tratamento de epilepsias

Numa revisão sistemática, publicada em 2018, os investigadores compararam um grupo de pacientes sob CBD sem clobazam, com um grupo de pacientes sob clobazam sem CBD e também com um outro grupo sob clobazam e CBD em simultâneo.

Esta revisão incluiu mais de 3 milhões de estudos, e encontraram 48 pacientes sob CBD apenas, 74 apenas sob clobazam e 54 sob CBD + clobazam em simultâneo. Em média, todos os pacientes já tinham estado sob pelo menos 5 antiepiléticos, antes de iniciar CBD ou clobazam.

Seguidamente à iniciação de CBD ou clobazam, 33% dos pacientes do grupo apenas sob CBD; 44% no grupo sob CBD + Clobazam; e 38% do grupo apenas sob clobazam, mostraram uma redução da frequência das crises superior a 50%. Não foram reportadas crises durante o período de follow-up em 14% dos pacientes do grupo sob CBD; 9% no grupo sob CBD + clobazam e 11% no grupo sob apenas clobazam. Uma melhoria pequena ou subjetiva foi relatada em 13% dos pacientes que iniciaram CBD posteriormente.

Em 16% dos pacientes, houve um aumento da frequência de crises após introdução do clobazam, significativamente superior quando comparado aos 4% no grupo CBD + clobazam, mas não foi significativamente diferente dos 6% referidos no grupo sob CBD.

Foi observada uma redução na quantidade de fármacos usados de 21% no grupo sob CBD; 26% no grupo sob CBD + clobazam; e 8% no grupo sob clobazam, após a introdução de CBD e/ou clobazam.

A razão mais frequente para descontinuar o uso de CBD foi a ausência de benefícios, enquanto a razão mais frequentemente relatada para descontinuação do clobazam foram os efeitos adversos. A sedação foi o efeito adversos mais vezes reportado, significativamente mais frequente no grupo sob clobazam, reportado por 36% dos pacientes deste grupo, versus 7% no grupo sob CBD + clobazam e 0% no grupo sob apenas CBD. 

Os autores deste artigo concluíram que extrações artesanais de CBD é útil no tratamento de epilepsias refratárias e é comparável à eficácia do clobazam.2

O Epidiolex®, consiste numa solução oral de 99% de CBD puro, aprovado em 2018 pela FDA, para o tratamento de epilepsias refratárias secundárias ao síndrome de Lennox-Gastaut e síndrome de Dravet. Em 2020, a esclerose tuberosa, tornou-se mais uma indicação aprovada. 

O Epidiolex, é o primeiro fármaco à base da planta da canábis, ou não sintetizado, aprovado nos EUA e pelo Infarmed em Portugal. A sua concentração é de 100mg por ml e a dose terapêutica recomendada encontra-se entre os 10-20 mg/kg/dia, com uma dose inicial de 5 mg/kg/dia. O medicamento contém álcool dihidratado, óleo de sementes de sésamo, sabor a morango e sucralose e não contém glúten. Os efeitos adversos mais comuns são sonolência (30%) e diarreia (24%).3

Em maio de 2017, um estudo publicado no New England Journal of Medicine, Devinsky et al. observaram 120 pacientes com síndrome de Dravet e idades compreendidas entre os 2-18 anos, num ensaio duplamente cego, controlado por placebo, com o Epidiolex®. O tratamento teve uma duração de 14 semanas, e os pacientes foram randomizados para um grupo sob CBD 20mg/kg/dia e para um grupo sob placebo, mantendo os fármacos antiepiléticos com os quais vinham a ser tratados. A média da diminuição na frequência mensal de convulsões epiléticas, no grupo sob CBD foi de 12,4 para 5,9, e no grupo sob placebo de 14,4 para 14,1, com significância estatística (p=0.08). A frequência total de convulsões de todos os tipos, foi significativamente reduzida com o CBD (Epidiolex®), mas não houve uma redução significativa nas convulsões não-epiléticas. A ausência de crises convulsivas foi atingida em 5% dos pacientes, versus 0% no grupo placebo.

Os efeitos adversos mais frequentes foram diarreia, vómitos, temperatura subfebril, fadiga, sonolência e elevação das enzimas hepáticas nos pacientes que estavam sob ácido valpróico.4

Em 2018, Thiele et al. publicaram os resultados do uso de gotas de Epidiolex® para convulsões secundarias a Síndrome de Lennox-Gastaut. O número total de pacientes foi de 171, com idades compreendidas entre os 2-55 anos. A duração do tratamento foi de 14 semanas, semelhante ao estudo anterior, com um grupo sob 20 mg/kg/dia de CBD, associado aos fármacos antiepiléticos que já tomavam e um outro grupo sob placebo. A média da redução mensal da frequência de convulsões foi de 43,9 no grupo sob Epidiolex® versus 21,8 no grupo sob placebo. Houve uma elevada ocorrência de efeitos adversos, mas estes foram considerados ligeiros a moderados e incluíram diarreia, sonolência, temperatura subfebril, diminuição do apetite e vómitos.5

Noutro estudo, Devinsky et al. publicado em 2018, o Epidiolex® foi administrado, num estudo open-label, a pacientes 4 tipos de epilepsias secundárias a doenças raras e graves. O número total de pacientes foi de 55, com idades compreendidas entre 1-30 anos. Destes 55 pacientes, 90% já estava sob 2 ou mais fármacos antiepiléticos, sem controlo da frequência das crises. 

A dose inicial de Epidiolex®, foi de 5 mg/kg/dia, administradas em 2 tomas por dia, em titulação crescente, até intolerância, ou um máximo de 25 mg/kg/dia, embora alguns centros tenham atingido os 50 mg/kg/dia. 

A redução média da frequência das crises, a partir da linha de base, foi de 51,4 na 12° semana, e de 59,1 na 48° semana de tratamento. 50% dos pacientes apresentaram uma redução da frequência das crises superior a 50% após 12 semanas, e este número aumenta para os 57% após 48 semanas. 

Não houve evidencia de tolerância ao efeito do CBD. Os efeitos adversos foram ligeiros, mas incluíram diarreia, fadiga, e aumento da sonolência.6

Bibliografia:
1 Sulak D, Saneto R, Goldstein B. The current status of artisanal cannabis for the treatment of epilepsy in the United States. Epilepsy & Behavior. 2017 May 1;70:328-33.
2 Porcari GS, Fu C, Doll ED, Carter EG, Carson RP. Efficacy of artisanal preparations of cannabidiol for the treatment of epilepsy: practical experiences in a tertiary medical center. Epilepsy & Behavior. 2018 Mar 1;80:240-6.
3 Laux LC, Bebin EM, Checketts D, Chez M, Flamini R, Marsh ED, Miller I, Nichol K, Park Y, Segal E, Seltzer L. Long-term safety and efficacy of cannabidiol in children and adults with treatment resistant Lennox-Gastaut syndrome or Dravet syndrome: Expanded access program results. Epilepsy research. 2019 Aug 1;154:13-20.
4 Devinsky O, Cross JH, Laux L, Marsh E, Miller I, Nabbout R, Scheffer IE, Thiele EA, Wright S. Trial of cannabidiol for drug-resistant seizures in the Dravet syndrome. New England Journal of Medicine. 2017 May 25;376(21):2011-20.
5 Thiele EA, Marsh ED, French JA, Mazurkiewicz-Beldzinska M, Benbadis SR, Joshi C, Lyons PD, Taylor A, Roberts C, Sommerville K, Gunning B. Cannabidiol in patients with seizures associated with Lennox-Gastaut syndrome (GWPCARE4): a randomised, double-blind, placebo-controlled phase 3 trial. The Lancet. 2018 Mar 17;391(10125):1085-96.
6 Devinsky O, Verducci C, Thiele EA, Laux LC, Patel AD, Filloux F, Szaflarski JP, Wilfong A, Clark GD, Park YD, Seltzer LE. Open-label use of highly purified CBD (Epidiolex®) in patients with CDKL5 deficiency disorder and Aicardi, Dup15q, and Doose syndromes. Epilepsy & Behavior. 2018 Sep 1;86:131-7.

O primeiro passo é procurar aconselhamento médico.